quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Carnaval Eterno

 D.Maria de Lourdes, ao centro, rainha do carnaval da Floresta Aurora

 Enviada por: Irene Santos, fotógrafa

D. Maria de Lourdes Martins tinha perto de 90 anos quando falou sobre sua participação nos distantes carnavais de rua dos anos 1930. Ela foi rainha do carnaval da Sociedade Floresta Aurora e contou:
__ “A gente era escolhida ( rainha do carnaval) por uma comissão da Sociedade. Faziam uma reunião e escolhiam uma moça. Depois a gente fazia a roupa para o baile. Papai concordou, desde que não tivesse  luxo. Dizia: Tá vestida? Tá bem vestida? Pronto. Não precisa luxo”
__”Na época,existiam “ os corsos”; era coisa muito bonita, sim senhora. Que vou lhe dizer uma coisa...eu fui rainha da Floresta ...então  arranjavam um carro  com  capota. Baixavam  aquela capota e a vestiam  muito bem vestida, toda enfeitada com flores, serpentinas. E a gente sentava ali... e faziam a volta na cidade... Menina, quando a gente chegava na frente da prefeitura a banda da Brigada Militar  estava nos esperando. “

__“Tão bonito , a banda da Brigada tocando... O nosso carro e mais outros seguiam com a banda, davam a volta na praça da Alfândega seguiam pela Rua da Praia e saiam na Borges. O corso seguia e a banda voltava para a frente da prefeitura.”

D. Maria seguiu contando como aconteciam os desfiles dos blocos: todos partiam da esquina da  Salgado Filho com a Borges de Medeiros , desciam em direção à Rua da Praia e seguiam por ela até a Praça da Alfândega. Dali em diante os blocos iam  para os bairros desfilar junto aos  coretos.

Nilo Ruschel no seu livro Rua da Praia aponta um aspecto quase ignorado dos desfiles
nos anos 1930:
Uma pitoresca(?) distinção ficou assinalada nêsse período, durante o carnaval da
Rua da Praia
,
marcando o preconceito de côr . Havia o "lado dos brancos" e o "lado dos pretos", sendo que êstes se colocavam à esquerda e aquêles à direita da rua, no sentido de quem desce na direção da praça da Alfândega”
 
Baile de carnaval da Sociedade Esmeralda no inicio dos anos 1930 . Revista do Globo

Na mesma época, parte da população da cidade preferia fugir da rua superlotada para brincar o carnaval dentro dos salões de baile como os "animados" foliões da Sociedade  Esmeralda.

Parece que o preconceito e a repulsa à festa popular é  característica de Porto Alegre há muito tempo. Ao contrário do que acontece nas outras capitais do país, aqui não existe mais carnaval de rua e nem desfiles dentro da cidade. E agora, pegando carona no sentimento de tristeza  nacional do momento, os anti-carnavalescos de plantão já mostram suas garrinhas nas redes sociais.
Carlos Eugenio em sua página no facebook, contrapõe aos mal-humorados oportunistas a sua equilibrada "Campanha Carnaval Eterno".
Ele está certo!

7 comentários:

  1. Excelente e preciso texto, Irene Santos! Os preconceituosos e racistas de plantão estão sempre a postos. Não é de hoje que sou defensora da folia de rua, do carnaval sem cordas, do carnaval anárquico, do povo movido pela alegria. Tem sido assim na longeva Banda DK e na Rua do Perdão, a primeira nascida nos idos anos de repressão e a segunda no início dos anos de 1980, focadas na participação popular. Griot Digital está de parabéns por trazer a lembrança de fatos peculiares da população negra de Porto Alegre. Estava fazendo falta este espaço e nós merecemos.

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  2. Valeu, Daisy. E quando quiseres discorrer mais sobre este ou outros assuntos que dominas, o Griot Digital vai adorar contar com tuas postagens.
    Abraços

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  3. Irene e Vera Daisy, grandes mulheres que nos inspiram a pensar, falar e ser mais e melhores negros e negras portoalegrenses!
    Falar sobre o Carnaval de Porto Alegre dos antigos tempos me sensibiliza por demais e me mobiliza. Por que a gente que herdou este legado, de alguma forma, tem que ter atitude para que nossa memória seja respeitada e entendida de forma integral e honrosa.
    Nós realmente merecemos ter um espaço que seja digno e que eternize nossas memórias.
    Abraços Nina Fola

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  4. Pois é, Nina, se a gente não cuidar das nossas memórias, outros vão se apropriar delas e dizer o que bem entenderem. E aí a gente não vai poder reclamar. Obrigada pelas tuas palavras de incentivo . Abraços.

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